quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

 

Diagnóstico médico-legal entre suicídio, homicídio e acidente por armas de fogo …

 

Trajectória do disparo

A reconstrução do trajecto que o projéctil percorre no interior do corpo da vítima deve ser apurado durante a autópsia. O trajecto deve ser descrito segundo três planos, usando como referência a posição anatómica: no plano frontal temos as direcções ântero-posterior, paralelo ou póstero-anterior; no plano horizontal o sentido ascendente, paralelo ou descendente; no plano sagital os sentidos esquerda-direita, paralelo ou direita-esquerda. O trajecto seguido pelo projéctil pode ser diferente consoante se trata de um homicídio ou de um suicídio. Nos suicídios, mais uma vez é mais fácil padronizar o trajecto comparativamente às situações de acidente e de homicídio, uma vez que ocorrem num contexto em que a vítima assume o controlo da situação, segurando a arma na mão, habitualmente a mão dominante, de um modo estável e confortável. Nos homicídios esta sistematização é mais difícil, se não impossível, já que se trata a maioria das vezes de um cenário dinâmico, muitas vezes com tentativa de fuga ou resistência à agressão e com distâncias de disparo mais alargadas. O mesmo problema pode ser levantado no que diz respeito aos casos de acidente, dado que o local de impacto, por definição, não é escolhido. Assim, consoante a localização anatómica do orifício de entrada, a trajectória do projéctil pode ser um forte indicador de um dos diagnósticos diferenciais. Relativamente aos ferimentos por arma de fogo na região temporal direita, os suicídios normalmente cursam com uma direcção ântero-posterior e ascendente (ou paralela no plano horizontal); uma direcção póstero-anterior e/ou descendente de um disparo na região temporal direita, apesar de ser mais frequentemente encontrada nos casos de suicídio, não aponta para esta causa. Nos ferimentos no hemitórax esquerdo, por exemplo, uma trajectória direita-esquerda ou paralela no plano horizontal é mais comum nos suicídios e o sentido oposto a este verifica-se nos homicídios em maior número de casos. Nos disparos, com orifício de entrada intraoral, o sentido ascendente é claramente preferencial nos suicídios, ao contrário do que se verifica nos homicídios, onde é mais comum o sentido paralelo ao plano horizontal, embora outros trajectos tenham sido descritos. A região cervical e dorsal superior são locais atípicos de entrada do disparo nos casos de suicídio mas, quando presentes, os projécteis descrevem geralmente um trajecto ascendente, enquanto que nos homicídios este trajecto pode assumir virtualmente qualquer direcção.

Revista : Arquivos de Medicina ( 2010 )

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