terça-feira, 17 de dezembro de 2024

Diagnóstico médico-legal entre suicídio, homicídio e acidente por armas de fogo …

VII - Distância do disparo

Considera-se a distância do disparo de uma arma pode variar consoante se trata de um suicídio, homicídio ou acidente. A distância de disparo é a distância entre o cano da arma e a superfície do corpo ou roupa da vítima na altura do disparo. Segundo diMaio, podem considerar-se quatro situações quanto à distância do disparo: “contacto”, “quase contacto” (estando a extremidade do cano a 2 ou 3 centímetros da superfície de impacto), “distância intermédia” (a uma distância média até 50 a 75 cm) e “à distância” (para distâncias superiores a 75 cm). Nos disparos de “contacto”, há ainda a possibilidade de ocorrer “contacto firme”, isto é, a arma é forçada contra a superfície de impacto, ou “contacto frouxo”, quando a arma toca apenas ao de leve na superfície do corpo. A estimativa da distância a que ocorreu o disparo é feita através da avaliação da presença de elementos de nuvem de resíduos de disparo, isto é, da presença ou ausência dos resíduos que saem pelo cano da arma aquando do disparo. Nos disparos de “contacto”, estes elementos penetram na ferida juntamente com o projéctil (podendo até verificar-se, no “contacto firme”, a existência da marca do cano à volta da orifício), enquanto que nos disparos de “quase contacto” e de “distância intermédia” há uma deposição de resíduos à volta do orifício de entrada ou directamente na roupa que cobria a área de impacto, cuja concentração por área de superfície é diferente em função da distância do disparo. No caso dos disparos de “distância intermédia”, a classificação da distância só é possível pela realização de disparos experimentais com a arma e munição “problema”, em circunstâncias idênticas às ocorridas no incidente fatal. Os disparos de “contacto” e “quase contacto” estão presentes na maioria dos casos de suicídio, sendo muito raros os casos em que se encontram ferimentos compatíveis com disparos à “distância intermédia” ou “à distância”. A justificação para que isto aconteça desta forma reside na limitação da distância do disparo imposta pelo comprimento do braço da vítima, devendo salvaguardar-se sempre a hipótese de utilização de um dispositivo accionado à distância (ex. corda, pau) e, nesses casos, poderemos ter mesmo em situações de suicídio, disparos por parte da vítima a “distância intermédia” ou “à distância”. Nos casos de homicídio, os disparos “à distância” e à “distância intermédia”, por esta ordem, são os mais frequentes, enquanto que os de “contacto” e “quase-contacto” são encontrados numa pequena percentagem dos casos, podendo ser encontrados em circunstâncias semelhantes a uma execução ou em situações em que a vítima é surpreendida ou incapaz de agir em defesa própria. Relativamente aos acidentes, dependendo da circunstância em que este ocorreu, a distância de disparo é extremamente variável, podendo ser observados disparos a qualquer distância. Nos acidentes, envolvendo só a vítima (ex.manipulação da arma) os disparos de “quase contacto” são os mais frequentes, e naqueles envolvendo outro indivíduo, predominam os disparos “à distância”. Assim sendo, perante a evidência de um disparo de “contacto” ou “quase contacto”, a hipótese de suicídio deve ser das primeiras a ser considerada, não podendo, no entanto, só por isso descartar as outras hipóteses. Quando se trata de um disparo a uma “distância intermédia” ou “à distância”, a hipótese de homicídio ganha mais força, não se podendo negligenciar, mais uma vez, as outras hipóteses, principalmente a de ocorrência de acidente.

Revista : Arquivos de Medicina ( 2010 )

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